
Por Lucca Vinha (Jejum) – TX
As eleições municipais foram uma tragédia para o campo democrático popular. E essa tragédia se verifica tanto externamente, com praticamente todos os partidos de esquerda e centro-esquerda tendo uma redução no número de votos de prefeituras e de vereadores. Quanto internamente, uma vez que o baixo nível da disputa entre a própria esquerda provavelmente enterrou qualquer possibilidade de aliança para 2022.
Não bastasse a derrota eleitoral, tivemos uma derrota interpretativa. No geral, tanto a esquerda quanto a centro-esquerda exaltaram o resultado como uma derrota do bolsonarismo. Primeiramente, é fundamental pontuar que existe um limite da influência do cenário nacional nas eleições municipais, principalmente em cidades pequenas. São locais em que parentesco, presença nas igrejas e festividades, amizade e uma série de outros fatores de contato mais direto entre eleitor e político/candidato faz com que a proximidade seja infinitamente mais importante que o posicionamento político-ideológico. Vejamos o singelo exemplo do município de Ribas do Rio Pardo (MS). Em 2018, 60% dos votos da cidade foram para Bolsonaro e, no dia 15, elegeram o primeiro prefeito do PSOL no estado. Alguns poderiam argumentar que isso é fruto de um efetivo trabalho de base do partido, reconquistando o voto para o campo popular. Se esse é o caso, por que a coligação fez apenas 1 dos 10 eleitos na cidade?
Só para deixar claro, não estou desmerecendo o partido, que com certeza tem gigantescos méritos para ter conseguido eleger o prefeito e um representante na câmara municipal. Apenas questiono se isso representa uma vitória contra o Bolsonaro. Questiono se esses votos serão contra ou a favor da extrema-direita no próximo pleito. Agora, se nem uma vitória do PSOL, que é um partido completamente comprometido na luta pela derrubada do fascista que habita o Alvorada, necessariamente representa uma nova frente de resistência e votos, imaginem a situação do resto do país. Como podemos afirmar que o bolsonarismo saiu derrotado deste pleito?
Para além da questão do Bolsonaro, outro erro interpretativo está no discurso de vitória eleitoral ou política. E aqui cabe destaque a dois partidos que perderam e saíram cantando vitória: PT e PDT. O primeiro, apesar de ter aumentado o número de votos e ter voltado a governar cidades do G96, sofreu uma enorme queda no número de prefeituras e uma leve queda no número de vereadores. Isso contrasta, e muito, com a crença de que 2016 foi o fundo do poço para o partido e que a partir daquele momento seria tudo ladeira acima. Já o segundo caiu em todos os quesitos, embora de forma pouco acentuada (algo diferente do que aconteceu com o PSB que despencou).
É fácil explicar a derrota petista sob a ótica do antipetismo. Porém, o que explica a derrota do PDT? O partido não é vítima de perseguição midiática desde que Brizola saiu do governo do RJ, nunca foi um partido associado a escândalos de corrupção, e ainda por cima tem o privilégio de contar com lideranças reconhecidas a nível nacional. E mesmo assim perdeu. Por quê?
Não escolhi o PT e o PDT como destaques à toa. Afinal, embora históricos aliados, hoje representam os dois pólos antagonistas que dividem a esquerda nacional. O problema é que a urna provou que a esquerda está, na mais otimista das análises, estagnada aos mesmos patamares de 2016. Nem as catastróficas gestão Temer e Bolsonaro propiciaram o terreno para nosso crescimento. E o motivo disso é que não enfrentamos o problema real que nos impede de crescer: o antipetismo.
Cabe aqui salientar que antipetismo é apenas o nome da moda, porque todos sabem que na realidade material estamos falando de anti-esquerda. E qual a postura dos dois pólos para enfrentar esse fenômeno político? Do lado mais à esquerda, um arrogante isolacionismo, que joga todas as suas fichas ainda no bom desempenho de suas passadas administrações, mas que evidentemente há muito não é mais suficiente sequer para fazer meia dúzia de vereadores em cidades pequenas. Não bastasse isso alguns dirigentes do próprio PT apostam – canalhamente – na “superação do lulismo”, uma malabarismo retórico que apenas serve para aprofundar as crises internas que o partido passa e, pior, legitima o discurso lava-jatista que nos colocou nesse buraco. Já a centro-esquerda tem uma postura ainda mais curiosa – e igualmente canalha – uma vez que vê o antipetismo como escada e não percebem que estão na verdade cavando a própria cova.
Os resultados de ambas posturas fratricidas é o crescimento do centrão e o consequente fortalecimento de Bolsonaro. E aqui cabe um outro adendo: a aposta de Ciro de se aproximar do DEM de Maia e do PSD de Kassab vai apenas enfraquecer o próprio PDT. É uma tentativa de reconstrução da política de conciliação exercida nos mandatos petistas, porém que já nasce morta, visto que a conjuntura política e econômica, assim como os interesses das classes dominantes, não mais permitem sequer sua cogitação. Mas isso é assunto para outro texto.
Voltando para o assunto que nos propomos discutir, a única maneira de combater o antipetismo é com a restituição dos direitos políticos de Lula. Não porque apenas ele pode vencer Bolsonaro em 2022, mas porque Lula é a representação máxima do estado de exceção que se consagrou com o golpe de 2016. E para superar esse cenário precisamos expor cada mentira, manipulação e crime cometido pela Operação Lava Jato, pelo Judiciário em geral e pelo Parlamento que levaram à condenação e prisão de Lula.
Enquanto ele for visto como um presidiário corrupto e imoral por parte gigantesca da população, a esquerda será vista da mesma forma. Não é à toa que a direita baseia toda a sua narrativa eleitoral nesses dois aspectos: corrupção e moralidade. Lembrem-se: o Ciro bateu mais no PT que muito cacique de direita e mesmo assim não consegue decolar. Pelo contrário.
É urgente a retomada da campanha Lula Inocente, e que seja encampada por todos os partidos, movimentos sociais e qualquer pessoa comprometida com o Estado de Direito e com a democracia. Comprometida com a derrota do fascismo. E essa necessidade vai muito além de uma mera questão eleitoral. Enquanto não enfrentarmos o simbolismo e a força do golpe, ano após ano vamos diminuir. Os direitos políticos de Lula devem ser restituídos não apenas para que ele possa ser candidato em 2022 (embora eu defenda que o seja, esse ainda é um debate secundário e prematuro). Devem ser restituídos porque enquanto Lula estiver condenado a narrativa que vence é a narrativa da Lava Jato. E essa narrativa apenas fortalece os responsáveis e promotores por todos os retrocessos que aconteceram no pós-golpe.
Seus direitos políticos devem ser restituídos porque é justo.
2020 foi uma tragédia. E vai continuar sendo uma tragédia enquanto não acabarmos com o antipetismo. E acabar com o antipetismo não é apenas uma forma de salvar o PT, é a única forma de fortalecer a esquerda e a centro-esquerda. Combater o antipetismo é combater o bolsonarismo.
Lula Livre porque Lula é Inocente!
Concordo que Lula é uma figura fundamental para a esquerda e que a narrativa lavajatista deve ser descontruída. Mas acho que a esquerda não pode colocar suas fichas em um Sr. com idade avançada, pelos motivos mais práticos possíveis e até por todo o desgaste que sua imagem sofreu desde a queda de Dilma. Para mim, a esquerda precisa se renovar e tomar seu lugar nas redes socias, fazendo parte do debate de forma mais acolhedora e paciente, sem os cancelamentos e os ataques. A esquerda deve contruir a imagem de seus novos líderes, Boulos e Manuela d’Ávila, para que em breve possam disputar a eleição presidencial com reais chances de vitória. É um momento de repensar os erros e aproveitar o desgaste do bolsonarismo e do liberalismo no país.
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