Por: Tiago Augustini e Pedro Sberni – TX da FDRP
Não mistureis alhos com bugalhos; é o dito popular que os editores do Estadão não aprenderam e, como sabem, isso acarretou pesadelos horríveis: vejam vocês, o negócio se deu de tal forma que não é uma escolha tão difícil ficar ao lado de Temer, o imperador da Transilvânia, e preterir o Diab… o seu Jair Paraquedista, depois de toda essa bad trip escrota em que nos metemos.
Mas não vamos contrariar o tal dito popular, Temer, o golpista, é passado, a escolha agora é outra; 2022 se avizinha e não iremos misturar humanos com outras entidades saídas das catacumbas, do esgoto da incivilização – ou até mesmo de “filhotes da ditadura” – Salve Brizola!
Como os que me leem bem sabem, na quinta feira dessa semana, o STF julgou, em plenário, as ações contra o ex-presidente Lula atinentes à operação Car Wash. Por 8 votos a 3, nosso molusco, o ex-presidente, torna-se elegível novamente para 2022, ou seja, o Supremo manteve a decisão do ministro Fachin e anulou as condenações pretéritas que foram forjadas no grupo de Telegram do Dallagnol e sua caterva.
Além disso, naquela mesma fatídica tarde de quinta, por 10 votos a 1, fora determinada a abertura da CPI da covid-19, que castiga dia e noite os brasileiros – chegamos ao absurdo de morrer mais pessoas que nascer. Mas ambas decisões não pegaram de surpresa você que me lê, não é verdade? Mas e daí? – Perguntaria o crítico atento – o que uma coisa tem a ver com a outra? – aí, meus caros e caras, necessitamos de análise um pouquinho mais profunda.
A primeira coisa que precisamos lembrar é a matéria na The Economist do longínquo 2009, sobre o Brasil daqueles tempos. O Cristo Redentor como um foguete e a manchete: “Brazil Takes Off!” – Havíamos conquistado postos avançados no setor econômico mundial e a política de distribuição de renda proporcionada pelo excelente Bolsa Família retirou muitas famílias da linha da pobreza e esquentou o comércio interno.
O Ex presidente Lula realmente mudou o cenário político brasileiro, sua aprovação ao cabo do segundo mandato ainda persistiu em 83% – um ser humano com cérebro em perfeitas condições pode perceber que não, o PT e Lula não foram responsáveis por “quebra brasileira” nenhuma.
Mas daí vieram os governos Dilma e, sobretudo, no que restou de seu segundo mandato, Dilma não conseguiu mais manter uma política adequada àqueles tempos e, pior, sofreu dura perseguição política culminando no show de horrores que fora o processo impeachment e sua queda. Bom, isso é história para boi dormir (minha avó se alegraria com esses ditos populares), mas surgiram movimentos incontroláveis após isso: o antipetismo e o bolsonarismo – um bolsonarista é antipetista, mas nem todo antipetista é bolsonarista.
O antipetismo é deletério ao debate e faz seus fiéis seguidores admitirem qualquer coisa desde que não seja alguém do PT. Relembremos o vídeo, de 2020, do português e intelectual Miguel de Souza Tavares:
Neste momento o país é dirigido por um fantoche, chamemos-lhe assim. Até me custa dizer isso, até me dói a alma pensar que este é o país de Machado de Assis; Drummond de Andrade; João Cabral de Mello; Chico Buarque; Juscelino Kubitschek; Niemeyer. Um país com gente extraordinária e conseguiu eleger alguém que é absolutamente ignorante e que é inimputável, incompetente e cruel […] E, honestamente, é naquilo que eu penso, naquela classe média brasileira culta, que não era ignorante e que achou que iria votar contra o PT do Lula, achou que valia tudo, e que qualquer coisa servia, e que qualquer um servia desde que apiasse o PT do poder, e o resultado está à vista – quando cai a crise da covid, o Brasil é dirigido por um incompetente absoluto…
Miguel de Souza Tavares
Logicamente não colocarei o vídeo todo aqui, mas é um comentário importante que se fez. Mas, então, o que teremos em 2022? Lula salvará a pátria? Bom, na recessão econômica em que o Bolsonaro nos enfiou, no colapso do desemprego e da fome que voltou a bater à porta dos mais vulneráveis – é bem difícil pensar em salvadores da pátria.
Lula é um ótimo quadro para 2022 e com certeza será um dos nomes mais fortes para o pleito. Mas o que me custa a entender é a falta de diálogo que os partidos da esquerda possuem com a população – o discurso bolsonarista está em qualquer família, talvez em alguns núcleos familiares claramente privilegiados não, mas o discurso bolsonarista é famoso por remeter-se às falas do tio de almoço de domingo, um fascismo dos homens bons, diria o Valter Hugo Mae.
O problema, portanto, meus caros, é o antipetismo – já disse o Juarez Campos – se o Lula é o antibiótico para o bolsonarismo, mas o que fazer contra a doença do antipetismo? O PT perdeu grandes locus nas eleições de 2020; como construir um diálogo com o empresariado, esse que se sente confortável em jantar com genocidas? E se Lula ganhar, haverá governabilidade?
Recentemente, a famosa blogueira Cynara Menezes, “Socialista Morena”, teve a felicidade de traduzir um pouco da mentalidade que habita certos nichos ao tuitar “só existem dois lados: os que amam o brasil e votariam no PT (ou “até no PT”) por ele X os que odeiam o PT e fariam tudo contra o PT, até destruir o brasil” (14/04).
Ora, se a nossa luta é pela clareza conceitual e pela verdade, se não aceitamos o Editorial bizarro do Estadão, o discurso que diz ser Bolsonaro um Lula com sinal ideológico trocado, um equivalente no plano cartesiano que é a mentalidade dessas análises (uma superfície que não admite qualquer interferência da complexidade, da terceira dimensão, levando até ao terraplanismo), é inaceitável reproduzir isso.
Já se pode sentir, nas profundezas rasas dos grupos de WhatsApp, aquela história de “O PT criou a narrativa do Nós X Eles”, dessa vez com fundamentação contemporânea renovada.
Não obstante, fazendo um esforço mínimo de interpretação, depreende-se que Lula não é o mais preocupado dos brasileiros com a Necropolítica de Bolsonaro, posicionando contra o Impeachment (diz-se que não há tempo para discutir isso) e até mesmo ensaiando, junto aos seus quadros mais próximos, posicionar-se contra a instalação da CPI do COVID. Combate-se Necropolítica com Necropolítica?
Aí que está, essas questões surgem para além da bolha considerável que depreende ser a narrativa da história, com os olhos cheios de lágrimas, o Ex-Presidente, livrando-se da cadeia pela segunda vez na vida, alçar-se ao posto de maior liderança política do país, pronto para retomar os bons momentos, cores, cheiros e alegrias que vivemos de 2003-2011. Fica a indicação da playlist “Infância no governo Lula”.
Todos devemos nos lembrar que o sistema político, social, jurídico e legislativo do Brasil mudou, desde 2016 – passou muita coisa no Congresso: Reforma Trabalhista; Teto de Gastos; Reforma da Previdência; Esvaziamento do Setor Público, etc. O Brasil como unidade não é o mesmo desde que Lula saiu e o próprio Lula não é mais o mesmo – o discurso mudou, como deve ser mesmo, meus caros e caras- ninguém aqui é determinista.
O Brasil de 2023 vai ser um outro país, estranho à muita coisa do Brasil de 2003. Tal fato nos faz questionar até mesmo se nosso Ex-Presidente vai se propor à candidatura pondo em risco seu legado.
Não sejamos meros saudosistas, por outro lado, a luta do bem contra o mal é moralismo, é Marvel, DC e desenhos que assistíamos quando governados pelo Barba. Bem contra o Mal não é sinônimo de luta de classes ou de Lula contra Bolsonaro. Ousemos olhar e ver o Outro com alguma humildade no olhar, para captar algo além do plano, dos sinais + e –. Quando a realidade estiver insuportável, liguemos as séries, filmes e artes (fica a indicação da série The Boys), é bem mais verdadeiro e criativo do que ceder ao Bovarismo característico de esperar D. Sebastião I de Portugal retornar.
Escolha muito difícil é ter que escolher entre Bolsonaro ser Genocida ou Psicopata, caso não pudéssemos escolher as duas ao mesmo tempo.